sexta-feira, novembro 25, 2011

Quase bonita

I am mainly an idiot
you are almost beautiful

Robert Creeley


eu julgo que és quase bonita
ao ver-te duplicada na janela
imunda de um comboio de inverno

ajeitas dois fios do teu cabelo
metes a mão à cara, porventura
a cheirar nos dedos o almoço

conferes o bilhete, o telemóvel
o conteúdo da mala não sem peso
toda a soma de últimos valores
de boa passageira infrequente

é que és mesmo quase de se amar
mirando a paisagem desolada
comigo, o maior dos idiotas
suspeitando de repente alguma morte

vagão quinze, pela tarde
körmend-szombathely

3 comentários:

CCF disse...

Muito bonito!
~CC~

Flávio Ricardo Vassoler disse...

De fato, o bem-querer tem uma poética de pequenos fragmentos - a posteriori (e infelizmente) estilhaços... - que, pelo afago do tempo, vão compondo um mosaico de veredas e sorrisos que forja o casal.

Me tocou sobretudo esse fragmento, João:

"ajeitas dois fios do teu cabelo
metes a mão à cara, porventura
a cheirar nos dedos o almoço".

O tempo desbanca o 'porventura' e funde a intimidade com o olhar que já sente o próprio cheiro.

Por fim, uma nota brasileira: não deixa de encantar o celular daqui dito como o telemóvel daí.

Um abraço,

Flávio Ricardo

João Miguel Henriques disse...

Obrigado a ambos pelos comentários. Hei-de começar a visitar a Ardósia Azul com mais regularidade. O Subsolo já o conheço, é um lugar agradável...
Um abraço.