terça-feira, setembro 06, 2011

Szeged: memorial no centenário da grande inundação 1879-1979



2 comentários:

Flávio Ricardo Vassoler disse...

Olá, João!

Acabo de ler o seu excerto "paradoxal". 

Essa clivagem de classes teve uma grande reviravolta quando precisamente Guimarães Rosa, o diplomata-sertanejo, trouxe a voz da alteridade a partir dela mesma. O escritor não apenas conhecia o universo das veredas como submergiu no grande sertão até forjar um estilo que lhe fosse próprio - a ele e ao sertão. 

No entanto, me ocorre agora um ponto que talvez tensione historicamente o compromisso de enformar a alteridade silenciada: na medida em que a sociedade de classes não apenas não se dissolveu como assistiu ao recrudescimento da desigualdade, o paradoxo inicial não ganharia hoje requintes de cinismo então inusitados quando a literatura caminhava pelos primórdios do modernismo que dava legitimidade a temas prosaicos? 

Me parece que, hoje, o paradoxo não é tão paradoxal se pensarmos no contexto original que prometia a sua superação. Atualmente, me parece que o paradoxo se transformou em uma segunda natureza, uma resignação conformista e/ou cínica que traz para o plano do cotidiano a impossibilidade de transformarmos a totalidade social. 

Como um brasileiro de classe média, João, vivencio esse paradoxo desde sempre, quiçá como uma primeira natureza. Estou certo de que você conhece bem o nosso Machado de Assis. Pois agora eu lhe pergunto: você conhece o Roberto Schwarz? Trata-se de um importante crítico literário que desde sempre vem refletindo sobre o paradoxal das deformações de classe na enformação literária. 

Pois eu fico curioso para saber o que você diria, como português, ao entrever as diversas camadas do paradoxo que se desdobram verticalmente para cima e para baixo - você mais do que eu sabe e sente o preconceito enraizado para lá dos Pirineus, né? 

Pois vale dizer que as literaturas periféricas - i.e., de países periféricos, já que Pessoa e Rosa não têm nada de menores - desdobram o paradoxo entre o desnível símbólico das diversas burguesias. 

Será que, na contramão desse multiculturalismo muito menos factual do que ideológico, não seria a voz "tragicínica" que poderia ao mesmo denunciar e ratificar um paradoxo histórico que não foi superado?

Tô sempre na penumbra do Quartos Escuros, João.

Abraços de além-mar,

Flávio Ricardo

João Miguel Henriques disse...

Obrigado pelo comentário e pelas reflexões, Flávio. O tema é realmente muito intricado, e acaba por ser fácil cair em armadilhas e preconceitos. Não conheço o Roberto Schwarz, mas vou tentar descobrir alguma coisa. Apesar de nunca comentar, também eu gosto de enveredar pelo subsolo. Abraço grande.