terça-feira, janeiro 13, 2004

Laboratório. Investidas de um fogo sobre material plástico de natureza química.

À primeira investida o material perde índices de solidez, o que é aliás atestado pelo nosso posterior manuseamento. A forma mantém-se porém inalterada, pelo menos a partir do nosso ponto de observação. Não são de igual modo verificadas alterações cromáticas. Emanação de leve odor químico, não sem mínimo efeito de atordoamento nos observadores.
A segunda investida do fogo é agora mais prolongada e incisiva que a precedente. Sem que se verifiquem mudanças de especial ao nível da cor e cheiro, a verdadeira novidade é uma mais acentuada perda de solidez. Na constatação por manuseamento, a matéria plástica revela-se elástica, sem que porém isso afecte radicalmente a sua consistência. Cola-se aos dedos, evade-se por debaixo das unhas e pelas reentrâncias da superfície de experimentação. O material apenas se desintegra por meio de movimentos bruscos ou cortantes.
O terceiro periodo de incineração faz com que o material adquira já certas manchas de cor chamuscada, não completamente negra. O cheiro é o de sempre, inofensivo e sem intensidade. Aí, a consistência segue o exemplo da solidez: dá de si sob a acção do fogo persistente. É possível desfazer o material com facilidade, já não se verificando a forte elasticidade de outros tempos.
Reunimos os fragmentos da matéria esquartejada num todo que é posteriormente submetido a uma quarta investida do lume, na qual depositamos algumas esperanças científicas. Na realidade, a passagem do estado sólido ao líquido parece à beira da consumação, fazendo-se acompanhar de festivos estalidos que cedo evoluem para reais explosões de matéria. O pequeno volume da mesma não deixava adivinhar uma tão acentuada ferocidade de explosão. Para além de surpreendidos, os observadores procuram refúgio num dos cantos do laboratório. Àquele que se aventura perto da mesa de experimentação munido de extintor de emergência, incendeiam-se-lhe as faces e partes significativas do torso. As chamas alastram a todo o laboratório e o poder explosivo da matéria é agora atroz. Esta reage ao acaso e de forma ostensiva à propagação do fogo opressor. Uma comissão de inquérito irá dias mais tarde questionar as condições de segurança do complexo e a competência científica da equipa responsável por tão audaz empresa.