segunda-feira, fevereiro 01, 2010

Das escolas literárias

(...) o Chico ria-se e amansava, dizia mais brando o que berrava: que só a personalidade tinha valor. Vingaria quem a tivesse, quem tivesse caminho próprio. Modas vinham, modas passavam - modas! Ao cabo, só havia de ficar o eterno. Escolas?! Daí a poucos anos, esse Futurismo, que a tantos fazia perder a cabeça, havia de ser um mono de museu da província, tanto como o Romantismo, como o Realismo, talvez ainda mais. Do Futurismo ficaria possivelmente algum nome, se aquele que o usara valesse, original e universal. O Futurismo devia até ser considerado menos afirmação do que negação, espécie de vassourada em ninho de pulgas. Caíssem na asneira de o tomar por afirmação, e esperassem pela pancada. Sempre eram pessoais os caminhos de cada verdadeiro artista, só ele os encontrava e só ele os podia seguir, ai dos que o imitassem. Daí a relativa fraqueza de Eça de Queirós, grande talento, mas apenas grande talento e jamais criador. E daí a grandeza de Camilo, sempre ele, sem lições de ninguém, descobridor, nascente e nunca torneira de água encanada, servido pelo essencial poder de expressão que lhe provinha de saber português, saber da arte de escrever, sem a qual: nicles! A grandeza de Camilo estava onde só podia estar, nele próprio, em originariamente sentir, no poder do coração e dos nervos. E à parte de qualquer escola: em todas e em nenhuma, como todos os grandes de todos os tempos. Aí o segredo da abelha...
Ria-se de modas e de escolas, o Chico. Passada qualquer moda, havia uma revisão de valores, um exame à escrita, e iam-se pelos esgotos, de rodilhão, os imitadores e os habilidosos, ficavam os raros de força própria, os que tinham sido gente por eles próprios. A História não o dizia?

Tomaz de Figueiredo, Nó Cego (1950)


1 comentário:

b.vilão disse...

Olha que maravilha... "No poder do coração e dos nervos". Essa é uma escola que não se aprende.