segunda-feira, maio 18, 2009

Apontamento de língua

Detenhamo-nos agora, à falta de melhor coisa com que nos entreter, em certas formulações do português europeu oral, como o são as expressões"já marchava", "servia perfeitamente" ou "partia-a toda cá com uma pinta", regra-geral pronunciadas por indivíduos do sexo masculino, em exercício de aberta heterossexualidade, e dirigidas a exemplares do sexo feminino, em marcha pela via pública ou imobilizadas, à vista do emissor em questão. À parte dos advérbios e locuções adverbiais, aqui reproduzidos a título meramente ilustrativo e propensos a toda uma extensa quantidade de variações, cabe-nos chamar desde logo a atenção para a tão portuguesa utilização do pretérito imperfeito do indicativo com sentido condicional, utilização essa de natureza acentuadamente coloquial, porventura passível de se explicar por certa familiaridade fonética com a forma condicional propriamente dita, isto pelo menos ao nível dos chamados verbos da 2ª e 3ª conjugações ("servia" é semelhante ao mais propriamente correcto "serviria", por exemplo).

Ao nível do sentido, porém, duas ordens semânticas parecem estar simultaneamente presentes, ainda que a níveis distintos. A primeira ordem de sentido tem naturalmente que ver com a utilização das formas verbais em causa, invariavelmente remetendo para o acto sexual, pressupondo concreta efectivação do coito. Deste modo, a forma "marchar" configura certo exercício metafórico de contornos algo insondáveis, porventura associados a um acto de consumo desenfreado, como na formulação "comprei três dúzias de cervejas para a festa e marcharam todas". No caso da utilização do verbo "partir", parece estarmos perante uma referência explícita ao movimento cadenciado da penetração, com evidente hiperbolização do mesmo, resultando em certa ideia de violência imposta pela lei do falo sequioso. Mas é a forma do verbo "servir" que aqui evidencia contornos de maior subtileza, por apenas resultar implícita a finalidade, o objectivo, enfim, a meta última para cuja consecução a avistada fêmea contribuiria. "Servia" então para quê? Para o coito, pois claro. Mas para quê, estritamente falando? Parece-nos aqui sugerir-se um sentido mais específico, entendido na sua derivação mais biológica. "Servia", está claro de ver, para o exercício ejaculatório e consequente (ou simultâneo) esvaziamento testicular. A segunda ordem de sentido que estas formulações colocam em evidência é, naturalemente, a menos imediata significação condicional. Menos imediata uma vez que muito raramente o falante elucida o ouvinte acerca das razões porque a fêmea não "marcha já", não "serve perfeitamente" ou não "é partida toda, agora mesmo, sem mais nem quê". Mas uma breve reflexão de teor sociológico, bem suportada por experiências próprias ou contacto com a experiência alheia, permite uma sucinta catalogação das condições sugeridas pelas mencionadas formulações de desejo sexual ou apreciação estética do espécime feminino. Dividimo-las em três classes primaciais, ilustrando-as devidamente do ponto de vista do falante, sem deixar de lado a hipótese de existirem outras sortes de classes que à presente análise tenham escapado:

  • Condições materiais e logísticas: o acto sexual seria efectivado se o falante tivesse dinheiro para pagar à fêmea em questão, se tivesse fracção ou lugar de automóvel onde levar a cabo o coito, se tivesse disponibilidade de tempo para o acto, etc.
  • Condições físico-psicológicas: o acto sexual seria efectivado se o falante tivesse um aparelho genital em razoáveis condições de desempenho ou se não fosse demasiado tímido ou inseguro para abordar a fêmea em causa com vista ao coito.
  • Condições morais e sociais: o acto sexual seria efectivdo se o falante não fosse já comprometido ou, no mesmo caso, se pudesse ser de algum modo garantido o sigilo relativamente à materialização do acto.

3 comentários:

S disse...

mi? nem értem :(
te a szexről írsz??? ejnye, János!
mindjárt megmutatom én neked, mi az a szex... :P

b.vilão disse...

E era assim que se devia leccionar nas aulas de português, que todo e qualquer adolescente prestava atenção e para perceber a ideia base ainda aprendia advérbios e locuções adverbiais, ordens semânticas, utilização do pretérito imperfeito do indicativo com sentido condicional e verbos da 2ª e 3ª conjugações. Isto sim é ser visionário. Reforma na Educação já.

Francisco Norega disse...

Ahah.

Tens toda a razão, b.vilão ;) Só mesmo com estes assuntos é que aprendíamos alguma coisa na escola xD

Excelente reflexão, João :) Temos de combinar qualquer coisa quando voltarmos a lisboa. ;P